domingo, 19 de abril de 2015

26 de fevereiro

Ele tomou para si a responsabilidade de me ensinar híndi. Apareceu com esse livrinho colorido, que tinha todo o alfabeto, junto com palavras básicas e imagens:
- É assim que as nossas crianças aprendem. Comece seguindo este livro.
Não importava que o alfabeto estivesse em Devanagri, que são aquelas letrinhas desenhadas, a mim tão incompreensíveis. Já me conformei que vou passar horas a desenhá-las, como tentei fazer, sem sucesso, com os ideogramas chineses, quando era criança e depois mais velha.
- E nesta página estão as vogais?
- As vogais não. Você vai começar pelas consoantes. – ele vira a página e aponta o que devo estudar.
Acho graça do tom imperativo com que os indianos falam, principalmente quando carinhosamente. Parece mais uma falta de jeito com a língua inglesa e não deixa de ter o seu charme, em especial quando nos contrariam ou quando dizem o que devemos pedir no cardápio.
O fato é que não entendo um terço do que ele fala. Mas gosto de estar ali e de ter alguém que se importa. E, por ele ter resolvido me ensinar, decido que quero mais ainda aprender. Ele enumera os dias da semana, cada um referente a um planeta. E a deuses diferentes também. Explica que em cada dia as pessoas celebram deuses específicos. Conta dos horóscopos e como as relações entre as pessoas são regidas pelos astros.
É incrível isso. Decido aprender uma língua e abre-se uma porta. Tanta coisa interessante no mundo. As origens e as culturas. Homem é “admi”, porque deriva do arábico e significa “que veio de Adão”. Já a outra palavra para homem, ser humano, deriva do sânscrito, “manav”: “descendente de Manu”, o progenitor do mundo de acordo com a crença hindu. Aprendo sobre as pessoas e encontro aquelas cujos astros conversam com os meus. Encontro a bondade. A generosidade. Um homem que me lembra meu pai, assim caladão, e que resolve me ensinar uma língua.
Mas é que com a língua a gente aprende um mundo.
E eu juro que entrei ali só para comer uma sobremesa e beber um chá.
Cada escolha nos abre uma nova porta. E às vezes é muito mais doce.

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