Ontem fui dormir com uma dor de cabeça fortíssima. Hoje acordei melhor. Mas ainda com aquela sensação de que o cérebro estava solto dentro da cabeça, e de que bastaria um movimento mais brusco para que ele saísse de seu eixo novamente.
Então entrei num modo câmera lenta. Era preciso que cada movimento fosse fluido e sutil. E era preciso que fosse silencioso. E ainda por cima era sábado e sábado sempre é dia de alguma lentidão.
Por isso me levantei tarde e saí de casa mais tarde ainda. Ao meio dia tomava chá e comia torradas e mingau de aveia com banana, no restaurante ao lado. E depois fui comprar pequenas coisas para tornar a casinha nova mais aconchegante. Tapetes ou pantufas, para enfrentar o chão gelado. Escolhi tapete. Pregadores de roupas para pendurar tudo - menos roupas - no varal de fita amarela que atravessa o quarto. Meias para dormir. Frutas para as manhãs.
Fui pela avenida principal, olhando as lojas do caminho. As motos sempre se jogam sobre a gente pelas ruas, eu fico brava e dou um grito. E o motociclista sempre ri da minha indignação. É minha a tarefa de desviar dos veículos, pois eles já fazem a parte deles, que é buzinar.
Incrivelmente hoje eu não me irritei com as buzinas ou com a loucura dos motoristas. Estar ali, naquela avenida, de repente era descanso de tudo. Normalmente passo os dias pelo rio - onde estão todos os viajantes que entrevisto. Então só de ser anônima em um local não turístico era quase como silêncio, embora não fosse.
Voltei para casa (a partir de agora, chamarei-a de casa, mesmo que seja um quartinho de albergue) com as mãos cheias de sacolas, recheadas de objetos que fariam daquele lugar um pouco mais meu. Depois fiquei olhando para as paredes rosadas, com vontade de enchê-las de pinturas. Mas lembrei que aquele quarto era meu, mas nem tanto.
Então fui andar pelo rio. Mas não o lado dos turistas, já que hoje é meu dia de folga. Fui para o lado de lá. Aquele, além do ghat das cremações, que é onde ninguém mais vai.
Fiquei olhando a vida dos que vivem apesar de nós, com meus olhos de câmera lenta. A vida das mulheres que fazem cestas. Das crianças que pedem para ser fotografadas. Das tantas pessoas que vêm falar comigo em híndi, como se aquela fosse a única língua possível. E que não entendem o fato de eu não entendê-las. Fiquei olhando os cachorros e as cabras. E admirei uma ave azul, que um homem veio explicar que era um pássaro pescador.
E, sobretudo, fiquei admirando as tantas pipas no céu. As crianças que as perseguiam e os tantos homens feitos, que as empinavam com a seriedade de missões de vida ou morte. E pensei que talvez eles tivessem razão. Talvez não houvesse no mundo nada mais importante do que empinar pipas. Deixar-se levar pelo vento, mas resistir. Resistir sempre. Sem perder a ternura.
Segui caminhando. Devagar quase divagando.
Então entrei num modo câmera lenta. Era preciso que cada movimento fosse fluido e sutil. E era preciso que fosse silencioso. E ainda por cima era sábado e sábado sempre é dia de alguma lentidão.
Por isso me levantei tarde e saí de casa mais tarde ainda. Ao meio dia tomava chá e comia torradas e mingau de aveia com banana, no restaurante ao lado. E depois fui comprar pequenas coisas para tornar a casinha nova mais aconchegante. Tapetes ou pantufas, para enfrentar o chão gelado. Escolhi tapete. Pregadores de roupas para pendurar tudo - menos roupas - no varal de fita amarela que atravessa o quarto. Meias para dormir. Frutas para as manhãs.
Fui pela avenida principal, olhando as lojas do caminho. As motos sempre se jogam sobre a gente pelas ruas, eu fico brava e dou um grito. E o motociclista sempre ri da minha indignação. É minha a tarefa de desviar dos veículos, pois eles já fazem a parte deles, que é buzinar.
Incrivelmente hoje eu não me irritei com as buzinas ou com a loucura dos motoristas. Estar ali, naquela avenida, de repente era descanso de tudo. Normalmente passo os dias pelo rio - onde estão todos os viajantes que entrevisto. Então só de ser anônima em um local não turístico era quase como silêncio, embora não fosse.
Voltei para casa (a partir de agora, chamarei-a de casa, mesmo que seja um quartinho de albergue) com as mãos cheias de sacolas, recheadas de objetos que fariam daquele lugar um pouco mais meu. Depois fiquei olhando para as paredes rosadas, com vontade de enchê-las de pinturas. Mas lembrei que aquele quarto era meu, mas nem tanto.
Então fui andar pelo rio. Mas não o lado dos turistas, já que hoje é meu dia de folga. Fui para o lado de lá. Aquele, além do ghat das cremações, que é onde ninguém mais vai.
Fiquei olhando a vida dos que vivem apesar de nós, com meus olhos de câmera lenta. A vida das mulheres que fazem cestas. Das crianças que pedem para ser fotografadas. Das tantas pessoas que vêm falar comigo em híndi, como se aquela fosse a única língua possível. E que não entendem o fato de eu não entendê-las. Fiquei olhando os cachorros e as cabras. E admirei uma ave azul, que um homem veio explicar que era um pássaro pescador.
E, sobretudo, fiquei admirando as tantas pipas no céu. As crianças que as perseguiam e os tantos homens feitos, que as empinavam com a seriedade de missões de vida ou morte. E pensei que talvez eles tivessem razão. Talvez não houvesse no mundo nada mais importante do que empinar pipas. Deixar-se levar pelo vento, mas resistir. Resistir sempre. Sem perder a ternura.
Segui caminhando. Devagar quase divagando.
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