Hoje saí procurando um restaurante diferente para almoçar. Acabei parando em um lugar pequenino e simpático. Pedi uma sopa, um chá e fiquei lendo meu livro.
De repente, vi algo a se movimentar pelo chão. Era um ratinho. Ratinho mesmo, bem pequeno. E, por sinal, era até muito bonitinho. Mas fiquei apreensiva. Passei a comer controlando-o com o olhar, para que ele não se aproximasse demais.
Qual era meu medo? Não sei. Parecia meio ridículo que um ser do meu tamanho temesse um bichinho tão pequeno.
Desculpei-me dizendo que há um tanto de poder na pequeneza.
E há.
Terminei minha sopa, paguei a conta e saí a andar.
O plano era o mesmo de todas as tardes. Parar em algum lugar para ler, encontrar viajantes para entrevistar, dar uma meditada, tomar um pouco de sol, quando tem. Hoje tinha. Encontrei um amigo no caminho, sentamo-nos em um degrau qualquer. Em seguida passou Kjala e já a puxei para mim.
Kjala é uma menininha, não sei sua idade, mas imagino que tenha em torno de oito anos. Conheci-a há vários dias, quando ela tentava vender uma caixinha de pigmentos coloridos e carimbos para a pele a mim e a um amigo viajante. Eu dizia que não queria comprar, ela insistia:
- Por que não?
- Porque já tenho uma.
- Você tem, ele não tem.
- Então, tente vender pra ele.
Ficávamos tempos nessa ladainha, repetindo o mesmo diálogo. E o engraçado era que isso não me chateava, porque ela tinha uma voz tão doce, que me agradava a repetição. E no final das contas, nem ela tinha esperança de nos vender nada, apenas andava conosco, consciente de que era bem-vinda. Quando ficávamos muitos minutos em silêncio, ela recomeçava, só para puxar assunto:
- Por que não?
Desde então nos encontrávamos sempre por aí. Certa vez, quando assistíamos à cerimônia do final da tarde, entreguei-lhe a minha câmera, para que ela fotografasse. Ela ficou compenetrada, buscando bons ângulos e enquadramentos. Fiquei surpresa com seu senso estético.
No outro dia, perguntou ao meu amigo:
- Quanto tempo você fica em Varanasi?
Ele respondeu:
- Talvez três, quatro...
- ... dias, né?
- Não, semanas.
- Semanas?! Olha, as pessoas vêm, vão pra Jaipur, pra Agra, viajam por aí. Mas ninguém vem pra ficar todo o tempo só em um lugar!
Afinal, esse amigo foi embora. E agora, quando a encontro, ela sempre pergunta por ele.
E talvez porque sua voz seja doce, ou porque ela seja pequena e leve, ou talvez pelos cabelos curtos ou por uma combinação disso tudo, eu a apelidei mentalmente de Sininho. E gosto de encontrá-la por aí.
Pois hoje a puxei para mim, novamente. Queria mostrar ao amigo que me acompanhava a caixinha de pigmentos que ela vendia. Ela se animou, começou a fazer uma pintura em sua mão. Escolhia as cores e as formas com cuidado, essa menina que é tão estética.
Então ele teve que sair, e ela resolveu pintar a minha mão. Depois começou a perguntar por um livro. Tirei meu livro da bolsa e entreguei-lhe. Quando percebi que ela queria arrancar uma página, falei que não podia.
- Pana. – ela repetia, em híndi, o que entendi ser página ou papel.
Depois ela já estava com meu celular em mãos, querendo fotografar.
- Ok, vou tirar uma foto sua.
Mas era ela quem queria ser a fotógrafa. Mostrou-me as poses que eu deveria fazer e ficou ali, fotografando. Aí apareceu um indiano querendo me fotografar também e ele, também, me dirigindo. E depois veio um viajante e começou a nos fotografar também. Quando vi, já estava entrevistando o viajante, enquanto Kjala resolveu sair para procurar a pana, que eu não lhe dera.
E eu achei graça daquela confusão toda. E de como, de alguma forma, ficara tudo ordenado.
E acho graça desses pequenos seres que cruzam a minha vida.
E de como é verdade: há um tanto de poder na pequeneza.
E há.
De repente, vi algo a se movimentar pelo chão. Era um ratinho. Ratinho mesmo, bem pequeno. E, por sinal, era até muito bonitinho. Mas fiquei apreensiva. Passei a comer controlando-o com o olhar, para que ele não se aproximasse demais.
Qual era meu medo? Não sei. Parecia meio ridículo que um ser do meu tamanho temesse um bichinho tão pequeno.
Desculpei-me dizendo que há um tanto de poder na pequeneza.
E há.
Terminei minha sopa, paguei a conta e saí a andar.
O plano era o mesmo de todas as tardes. Parar em algum lugar para ler, encontrar viajantes para entrevistar, dar uma meditada, tomar um pouco de sol, quando tem. Hoje tinha. Encontrei um amigo no caminho, sentamo-nos em um degrau qualquer. Em seguida passou Kjala e já a puxei para mim.
Kjala é uma menininha, não sei sua idade, mas imagino que tenha em torno de oito anos. Conheci-a há vários dias, quando ela tentava vender uma caixinha de pigmentos coloridos e carimbos para a pele a mim e a um amigo viajante. Eu dizia que não queria comprar, ela insistia:
- Por que não?
- Porque já tenho uma.
- Você tem, ele não tem.
- Então, tente vender pra ele.
Ficávamos tempos nessa ladainha, repetindo o mesmo diálogo. E o engraçado era que isso não me chateava, porque ela tinha uma voz tão doce, que me agradava a repetição. E no final das contas, nem ela tinha esperança de nos vender nada, apenas andava conosco, consciente de que era bem-vinda. Quando ficávamos muitos minutos em silêncio, ela recomeçava, só para puxar assunto:
- Por que não?
Desde então nos encontrávamos sempre por aí. Certa vez, quando assistíamos à cerimônia do final da tarde, entreguei-lhe a minha câmera, para que ela fotografasse. Ela ficou compenetrada, buscando bons ângulos e enquadramentos. Fiquei surpresa com seu senso estético.
No outro dia, perguntou ao meu amigo:
- Quanto tempo você fica em Varanasi?
Ele respondeu:
- Talvez três, quatro...
- ... dias, né?
- Não, semanas.
- Semanas?! Olha, as pessoas vêm, vão pra Jaipur, pra Agra, viajam por aí. Mas ninguém vem pra ficar todo o tempo só em um lugar!
Afinal, esse amigo foi embora. E agora, quando a encontro, ela sempre pergunta por ele.
E talvez porque sua voz seja doce, ou porque ela seja pequena e leve, ou talvez pelos cabelos curtos ou por uma combinação disso tudo, eu a apelidei mentalmente de Sininho. E gosto de encontrá-la por aí.
Pois hoje a puxei para mim, novamente. Queria mostrar ao amigo que me acompanhava a caixinha de pigmentos que ela vendia. Ela se animou, começou a fazer uma pintura em sua mão. Escolhia as cores e as formas com cuidado, essa menina que é tão estética.
Então ele teve que sair, e ela resolveu pintar a minha mão. Depois começou a perguntar por um livro. Tirei meu livro da bolsa e entreguei-lhe. Quando percebi que ela queria arrancar uma página, falei que não podia.
- Pana. – ela repetia, em híndi, o que entendi ser página ou papel.
Depois ela já estava com meu celular em mãos, querendo fotografar.
- Ok, vou tirar uma foto sua.
Mas era ela quem queria ser a fotógrafa. Mostrou-me as poses que eu deveria fazer e ficou ali, fotografando. Aí apareceu um indiano querendo me fotografar também e ele, também, me dirigindo. E depois veio um viajante e começou a nos fotografar também. Quando vi, já estava entrevistando o viajante, enquanto Kjala resolveu sair para procurar a pana, que eu não lhe dera.
E eu achei graça daquela confusão toda. E de como, de alguma forma, ficara tudo ordenado.
E acho graça desses pequenos seres que cruzam a minha vida.
E de como é verdade: há um tanto de poder na pequeneza.
E há.
Nenhum comentário:
Postar um comentário