(Parte III de "A Revolução será fofa!")
Xavier não fala em política.
Obviamente ele não é ingênuo para acreditar que exista posicionamento a-político.
Ou reacionário a ponto de desejar a manutenção do status quo.
Xavier é artista. Sabe que a Arte é, em si, transformadora. Política. Ainda que não seja ( e não tem que ser ) panfletária.
Não o objeto artístico convencionado, legitimado, exposto em museus. Mas a relação. A experiência artística, que reside no revirar, expor camadas, abrir espaços vazios. Provocar questionamentos, ainda que não verbais.
A verdadeira experiência artística reside em ampliação, comunhão. Ou seja: Amor. É extremamente político isso. Porque não se encerra em si. Tudo é problema meu, sim, já que sou tudo isso: o mundo.
Xavier é artista performático. Sua expressão é seu corpo, que ele não vende. Xavier rejeita os espetáculos midiáticos, apesar do porte de galã.
Sua tática é deslocar sentidos e usos convencionais. Posar todas as manhãs como esfinge sobre a pia. Depois se atirar à nossa frente na escada, barriga para cima, boca aberta. Provocar estranhamento. Eliminar fronteiras. Então, como um cachorro, ele arfa, com a língua para fora da boca. Depois senta-se de bunda no chão e lambe sua barriga rosada de porquinho. E assim nos lança no incômodo espaço da indefinição.
No outro dia estávamos no quarto. Xavier queria que eu abrisse a porta para ele sair. Mas, diferentemente dos gatos convencionais, que miam seu protesto perante a porta, ele preferiu performar artisticamente em nome de sua causa. Arrastava-se de lado, conseguindo impulso no colchão. Pulava na cama, recomeçava o circuito.
Eu, em meu abuso de poder, entendi o que ele queria, mas a cena era tão divertida, que o mantive lá, para que o espetáculo não terminasse. Sem se alterar, Xavier subiu em minha cama mais uma vez. Posicionou-se sobre minhas roupas.
E fez um cocô-manifesto.
Xavier tem essa arte agressiva. Fétida. Sensorial. Ele dispensa palavras: joga sobre a pilha de roupas limpas o choque da merda. Lança-nos no abismo da falta de sentido. Da escatologia, em seu sentido original. Pois escatologia não se refere necessariamente ao que é nojento, mas ao fim das coisas (por isso o que sai do corpo é escatológico), ao sentido último: Para onde vamos, afinal?
E a verdade é que não sabemos para onde vamos. Mas Xavier segue abrindo espaços vazios, questionamentos. Ele performa o ilógico e acha linda a indefinição. É preciso que haja Arte para que haja transformação. É preciso que não saibamos exatamente aonde vamos chegar. É preciso criar uma forma completamente nova: uma outra linguagem, uma outra visão.
Tem que ser imprevisível, para que seja Revolução.
8 comentários:
Lian, quero colocar num quadro. Num outdor, num painel. Sei lá. Bom demais!!
Não consegui compreender este último texto da série. O palavreado é muito rebuscado. Talvez seja porque não tenha instrução e inteligência o suficiente para compreendê-lo. Mas parece-me bem construído esteticamente, e realmente ficaria muito bom se colocado em uma moldura.
Também não entendi a piada! Mas o gato está a sorrir!
Muito bom
Não entendi tudo, mas adorei a revolução dos gatos! :D
Sasha, que já virou estrela tinha um miado bem específico para pedir que abrisse a porta para vadiar na sacada. Eles dizem, mas de um jeito que demanda muitos miados e tradução.
O poder tem seu preço, viu?
Abraço.
Fazia tempo que nao passava por aqui. Que linda essa trilogia! Parabens! É uma viagem minha ou as personalidades dos 3 gatos formam a da autora, tipo Santíssima Trindade? Hehehehhe Parabens, de novo!
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