segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Amar e mudar as coisas


Há alguns dias minha amiga Júlia postou um texto em seu blog (http://juliaemexcesso.blogspot.com.br) sobre suas reflexões a partir de músicas do Belchior. Li-o saudosa de tantas coisas: das longas conversas em que refletíamos sobre a vida; das músicas do Belchior que eu tanto ouvi, algumas das quais já nem me lembrava; dos seus shows aonde íamos juntas, antes de ele desaparecer pelo Uruguai.

Relembrando suas velhas canções, um trecho permaneceu em minha cabeça: "Amar e mudar as coisas me interessa mais". Já discutimos tanto a essência, a existência e o fenômeno, para chegar até aqui. Talvez seja este meu atual tema de vida: "amar e mudar as coisas", depois de a linguagem ter falhado e de a filosofia nunca ter respondido às minhas questões primeiras. Hoje é o simples do amor e suas perguntas que me interessa mais.

Em uma rodoviária na Bolívia, quando eu dava dinheiro a uma velhinha, meu companheiro questionou: "Por que você fica dando esmolas, se no Brasil você não dá?". Ele tinha razão, quase não dou esmolas por aqui, o que se deve, em parte, pela consciência da minha incapacidade de assim transformar qualquer coisa. Respondi que não dou esmolas, mas que, quando dá na telha, eu dou. O que também é verdade.

E meu dar na telha é sempre assim arbitrário. Um capricho, quase. Tenho essa aversão a pedir, como tenho a que me peçam. Nasci para o mundo de graça e assim passei a esperar que as coisas fossem sempre. É dessa forma que me posicionei na vida: "quando me dá na telha" é o único quando que sei proceder. E é assim, também, que às vezes egoisticamente dou esmolas. Quase nunca quando me pedem.

Pois dois dias atrás eu caminhava para o mercado e cruzei com um mendigo que dormia sobre a calçada. E me "deu na telha" fazê-lo sorrir. Já no mercado, separei uma sacola de compras para ele, com comidinhas e suco de frutas. Meu plano era deixar ao seu lado, para que ele encontrasse o pacote ao acordar. Mas, quando passei por ele novamente, ele já abria os olhos e pedia dinheiro aos passantes, ainda deitado. Uma senhora entregou-lhe alguma coisa, enquanto eu parei ao seu lado. Dei-lhe "boa tarde" e entreguei, eu também, as compras que tinha feito. Ele abriu um sorriso lindo e levantou os braços, mais num gesto de alegria incontida do que de louvor, dizendo: "Está vendo como deus é justo?". Saí sorridente de seu sorriso. Naquela tarde havia me dado na telha sorrir alguém para me alegrar. Aquilo não transformava nada da realidade do mundo, senão o meu dia.

"Amar e mudar as coisas..."

Então me dei conta de que talvez eu nunca possa mudar as coisas.

Mas posso ainda amar e fazer sorrir e me alegrar com a gratuidade do amor. 

Amar e amar e amar. Me interessa mais.




4 comentários:

Julia Lemos disse...

Lian, estamos muito em sintonia. É bem isso mesmo: não podemos resolver o mundo, mas podemos mudar o dia de alguém. Amar e mudar as coisas, simplesmente.

Anônimo disse...

Lian, sua idéia de "amar e fazer sorrir e se alegrar com a gratuidade do amor", me fez lembrar de um pensamento e compartilho-o:

"O Valo de Um Sorriso

Não custa nada e rende muito.
Enriquece quem o recebe, sem empobre-cer que o dá.
Dura somente um instante, mas seus efeitos perduram para sempre.
Ninguém é tão rico que dele não precise.
Ninguém é tão pobre que o não possa dar a todos.
Leva a felicidade a todos e à toda parte.
É símbolo da amizade, da boa vontade. É alento para os desanimados; repouso para os cansados; raio de sol para os tristes; ressurreição para os desesperados.
Não se compra e sem empresta.
Nenhuma moeda do mundo pode pagar o seu valor.
Não há ninguém que precise tanto de um sorriso, como aquele que não sabe mais sorrir."

Abraços, Pucci.

Clarice disse...

Tenho questionado tudo e em quantidades imensas, desde sempre. A quilometragem mostra que o que nos acontece, muitas vezes tem a ver com deixar acontecer, deixar fluir. Não canso de me surpreender sobre como muitas coisas na minha vida simplesmente me encontraram no meio do caminho.
Gostar do que se faz e deixar que o pocesso não se interrompa, já é uma mudança e tanto.
Bom voltar a ler você.
Abração.

Leilane disse...

E você realmente acha que não muda o mundo???