terça-feira, 3 de julho de 2012

Carros chineses


Meu pai tem mania de ficar feliz ao ver carros chineses:

- Não é mania! - diria ele - Também não é nacionalismo!

E, enquanto buscamos explicações, ele resmunga:

- Vocês não entendem.

Nós não entendemos, por mais que tentemos penetrar nessa lógica tão dele.  Às vezes me atrapalho tentando seguir esse mundo que não entendo. Certa vez, conversávamos sobre aniversários e datas especiais. Ele dizia que não gostava de nada disso. Eu disse que tudo bem ignorar dia dos pais, das crianças e afins, mas que aniversário era uma data importantíssima. Ele me respondeu que esse era meu pensamento, mas que ele era diferente de mim. Naquele ano, mesmo sem compreender, resolvi respeitar seu sentimento em relação à data. Mesmo lembrando, fingi ignorar seu aniversário, para que ele não se sentisse desconfortável. Fiz o mesmo no dia dos pais, ainda que a mídia e a publicidade obviamente impossibilitassem o esquecimento. Mais tarde, soube por minha mãe que ele havia se chateado. Fui tirar satisfação e ele me respondeu:

- Não gosto de festa, não ligo para presente, mas ninguém gosta de ser esquecido.

Entendi. Nem sempre eu entendo.

Mas quem disse que se pode apreender racionalmente a alegria de alguém? Meu pai gosta de ver carros chineses. Quando o encontro ele me conta:

- Hoje vi dois.

Eu vejo o brilho em seus olhos e os meus brilham também. Às vezes, quando estou com ele, em Goiânia, no meio do trânsito, ele dá um berro:

- Olha, olha!!!!
- O quê??
- Um carro chinês!
- Ah, era isso? Ufa, que susto você me deu!

E vou achando graça das manias do meu pai. Quase sem perceber que o amor nos lega, também, suas manias. A minha é ficar alegre por sua alegria, mesmo que imaginária. Por isso, sempre que vejo um carro chinês, onde quer que eu ande, eu penso que o meu pai ficaria feliz, se estivesse aqui. Me ocorrem pensamentos do tipo "vou contar pra ele" ou "vou tirar uma foto e mandar por e-mail". Não faço nada disso. Só imagino sua satisfação e então fico, eu, feliz. 

Agora, sempre que vejo um desses carros circulando pela rua, sinto uma alegria inefável, dessas que, por não caber em nenhuma explicação, só tem cabimento na linguagem do amor. E encontro, enfim, uma razão. 

5 comentários:

Julia Lemos disse...

Lian, acho lindo suas declarações de amor ao seu pai. Isso é tão importante! eu também gostaria de expor assim, num texto lindo, o quanto meu pai é importante pra mim. Também mil vezes penso em tirar fotos de coisas que fariam meu pai feliz, ou mandar um texto que ele gostaria, mas não o faço, apenas sinto aquela alegria imensa. Igual você falou aqui. Mas é tão importante demonstrar isso. Se não eles podem não saber. Essa coisa de expressar o amor quando ele é muito grande. É tão difícil, mas tão importante!

Maria Cristina disse...

Ai, não sei o que é mais lindo, o seu texto ou o comentário da Júlia rsrsrs

E já faz um tempo que, quando eu vejo um carro chinês, me lembro do seu pai rsrsrs

Simone Evangelista disse...

Que post mais lindo, Lian! Sou total manteiga derretida quando o assunto é o meu pai, me identifiquei bastante. Adorei o blog, vou passar mais vezes por aqui. Beijos!

Erika Lettry disse...

Eu me divirto muito qdo vc conta histórias do seu pai. Meu pai tb é um pândego, mas não tenho o mesmo talento q vc para contar as histórias..hehe

Veronica Linder disse...

Quando eu ver um carro chinês, vou ficar feliz pelo seu pai.