sábado, 12 de julho de 2014
Com açúcar, com afeto
Foi em Búzios que começou meu vício por açaí.
O açaí lá é como na maioria das cidades pequenas: só se sente o gosto do xarope, dulcíssimo. E colocam, por cima, todas as tranqueiras possíveis: calda de morango, leite condensado, granulado de chocolate, gummy bears.
O meu era açaí com paçoca.
Mas tinha gosto de caminhadas solitárias e infinitas, de pele salgada, de cabelo secando ao sol. Tinha gosto de mergulhar no mar e subir pedras. De procurar praias escondidas, de batizar pedaços de areia que eu jurava serem só meus.
De silêncio.
Quando voltei ao Rio, já era quase Carnaval. E continuei buscando aquele sabor durante algum tempo. Paçoca, nem sempre tinha. Mas açaí cheio de xarope eu encontrava em qualquer esquina e tomava duas, três vezes ao dia.
Lembro o dia em que ele chegou. Olhou para o copo na minha mão e perguntou:
- O que é isso?
- Açaí. Quer?
Ele quis. Tomou uma colherada avidamente. Eu ofereci o copo inteiro. Ele quis. Eu ofereci a granola do armário. Ele quis também.
E como eu queria que ele quisesse tudo!
Com o tempo fui depurando meu gosto, descobrindo os lugares que tinham os melhores açaís (cortei a paçoca, claro), sabendo reconhecer a textura certa:
- Se brilha, é só xarope com gelo. O verdadeiro açaí tem que ser aveludado.
Até que descobri o melhor. Passei a tomá-lo todas as noites. Sem xarope, só com açúcar. Pouco açúcar, sempre.
- Granola ou tapioca?
- Nada disso, obrigada.
Ele me acompanhava nisso. Buscava comigo os melhores lugares, fazia experimentações. Ele, que tinha mania de perfeição, um dia me falou:
- Agora você tem que aprender a tomar açaí sem açúcar, como fazem no Norte.
Eu, que não gosto que me digam o que fazer, rebati:
- Eu não tenho que nada.
E quando começamos a amargar, seguimos cada um para um lado.
Há coisas sem as quais pensamos que não podemos viver. No entanto, estamos aqui, vivos e até felizes. Às vezes felizes por estarmos vivos. Às vezes surpresos por estarmos felizes.
Eu sei que continuo aqui e tomando meu açaí todas as noites. Houve uma delas em que eu estava com uma amiga em casa e me lembrei do açaí guardado na geladeira. Estava sem açúcar, pois meu intuito era tomá-lo com mel. Antes de colocá-lo, porém, resolvi provar uma colherada.
- Ué! É bom!
E uma noite assim, de repente, descobri que não precisava mais do açúcar no açaí.
Mas era mais doce com ele.
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2 comentários:
morei em belém e lá eles dizem que o pior açaí é mandando para o Sudeste. o açaí mue eles gostam é bem como você falou, aveludado.
abraços, juliano
gostei :)
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