quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Das coisas que não entendo

Eu só esperava isso dela: que sobrevivesse. Tinha tudo aquilo que ela trazia para mim: o abraço com as garrinhas firmes, o calor que me esquentava o pescoço, o barulhinho que me fazia rir. Mas eu sabia que esse presentes eram efêmeros e que ela era para o mundo e não para mim.

Quando voltei ao Rio, os primeiros dias sem ela doeram. Eu acordava triste, com frio no pescoço. Aos poucos fui me acostumando a acordar sozinha, a não ter ninguém me agarrando o ombro, a não ter a felicidade diária de ver vida aprendendo a viver. Ganhei um presente lindo de um amigo igualmente lindo: uma tamanduinha de pelúcia, com que passei a dormir abraçadinha e a segurar as patinhas fechadas para relembrar seu tato.

Minha vida seguiria e minha preocupação era que a dela também seguisse. Cachorro e gato nós criamos para nós, para nos fazer companhia, para estar ao redor. Mas quem tem privilégio de criar tamanduinha, mesmo que seja por poucos dias, tem essa experiência de um amor muito verdadeiro. O cuidar de um ser para que ele viva. E é esse o único retorno que eu esperava dela. Vida. E talvez outras vidas, talvez um filhotinho que se agarrasse nela como ela se agarrava em meus braços e meus ombros. Eu pensava que, quando ela tivesse um serzinho para cuidar, então ela superaria o trauma de ter sido órfã tão cedo.

Tive um passarinho em minhas mãos por um dia e, quando ele morreu, sofri um tanto. Passarinho é pra voar, não pra morrer. Tamanduá é pra andar no mato, beber água, catar formiga, ter filhote. Tamanduá é pra viver. Tamanduinha era pra crescer forte, pra aprender a mamar e desmamar, pra aprender a cavucar terra, pra ser plena no mundo.

Tamanduinha, sobretudo, não era pra morrer afogada.

Não era.

9 comentários:

Anônimo disse...

Eu acho que essa foi a única criatura do planeta em que pedi, em vão é claro, que voltasse!!.. "Quero a tamanduinha de volta!!!" eu exclamava. Estou numa fase de ainda não acreditar E DE ter RAIVA! mas dizem q em outras dimensões ainda estamos ali com ela no quintal fuçando na terra.. meio difícil entender.. dizem q o melhor a fazer é encarar tudo da forma mais aberta possível.. depois o tempo nos cuida..

Ana disse...

Que triste é sempre dolorido perder seres que amamos. Mas ao mesmo tempo é bom sentir que somos capazes de amar de forma tão pura e sem esperar por nada em troca.

Daniel Borges disse...

Lian, talvez ela tinha um objetivo, o de gerar em você uma vontade de mãe!
será que está chegando a hora?

Beijos

Maria Cristina disse...

Mas como assim? Tinha alguém cuidando dela e deixou ela se afogar? Coitadinha...

Erika Lettry disse...

Tadinha da tamanduinha...E eu nem a conheci...snif...

Marina Mota disse...

É sério isso??? Inacreditável... mais estranho do q alguém q tem uma tamanduinha de estimação... me conta isso direito...

Mr. G disse...

linda homenagem!!

super bem escrita. tocante e lindas fotos!!

bjão!

alicexavier@bol.com.br disse...

Ah não... fiquei com tanta vontade de conhecer sua tamanduinha... mas... ela cumpriu seu objetivo. Que bom é amar!

Julia Lemos disse...

Lian, não sei bem o que dizer nessas horas tão tristes. mas tenho certeza que em vida a tamanduinha sentiu um amor de acolhimento e que vc fez parte disso. E ela fez parte da sua história na lida com essa angústia da natureza da vida que, por ser vida acaba um dia.