quinta-feira, 6 de junho de 2013
Tererê
Odeio salão de beleza. Odeio. Fazer cabelo, fazer unha e essas coisas todas.
Gosto de pentear meu cabelo com os dedos mesmo. Não tenho pente, nem escova, nem secador e nenhuma dessas parafernálias em casa.
Gosto de mãos limpas. Acho bonito. Unha com cor de unha. Coisa minha.
Mas o motivo principal pelo qual odeio salões é que é tudo tão demorado. Daí a gente passa a tarde lá, esperando. A mulherada conversa sobre tudo. E eu me sinto sempre menos mulher. Pelo menos desse tipo de mulher de classe média que anda com cabelo e unhas arrumados. Meus pés são ásperos de andar no mato descalça. E eu não gosto dessa demora sentada, me sinto um E.T., que não sabe interagir, não sabe conversar sobre a novela, o namorado e as roupas. Não sabe folhear Revista Caras, nem Capricho, nem Marie Claire, sem se sentir meio tonta, meio ansiosa pelas exigências do consumo, meio feia diante das modelos lindas.
Odeio salão de beleza. Odeio.
Mas adoro fazer tererê. Na areia, no calçadão, em alguma cidadezinha perdida por aí.
Acho bonito, também. Mas o motivo principal pelo qual adoro fazer tererê é que demora.
Eu gosto dessa demora sentada, me sinto humana.
Aproveito o tempo para papear. Às vezes passa alguém e gosta, senta ao nosso lado no chão, entra na conversa. Eu pergunto de tudo. Gosto de saber da vida das pessoas.
"A gente passa por muita dificuldade, com polícia principalmente. As pessoas já têm preconceito contra preto. Hippie e preto, então, fodeu." - alguém me conta. De vez em sempre faço tererê com algum dos irmãos latino-americanos: um boliviano, um colombiano, uma argentina. Um deles me contava sobre a violência de seu país, sobre os tantos amigos e parentes perdidos. Eu sempre tento reter, mas confesso que nem sempre consigo entender tudo o que eles dizem.
Certa vez fiquei conversando com um hippie que estava começando a se estabilizar e tinha arranjado uma casinha no morro: "Ainda quero que você conheça a minha casa. Quem sabe um dia a gente acabe se casando." Quem sabe. A gente não sabe de nada, mas eu fico tentando entender.
"Meu tererê é diferente, é indígena." - me explicou um índio, trançando meu cabelo com linhas em estilo macramê. Sinto não saber de que povo ele era. Ele repetiu duas vezes, mas eu, diante da palavra desconhecida, perdi no ar a informação. "Nós não existimos mais como povo, pois nossa área foi destruída." - contou. Perguntei de que estado era a família dele. "Da Amazônia. Na verdade, da Amazônia boliviana, mas pra gente não existe essa diferença, Amazônia é uma coisa só".
"Quer uma miçanga na ponta?" Quero. Uma conchinha também.
De repente está pronto meu tererê.
E vou embora mais mulher.
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6 comentários:
Por acaso, pesquisando sobre uma curiosidade na internet (a história do culote da Maria Chiquinha), encontrei essa página. E não é que tem muita coisa interessante por aqui? Adorei seu jeito natural de escrever e a beleza do que diz. Achei que seria pecado não deixar isso registrado.
Acho lindo esse estilo natural, sobretudo por aquilo que ele representa. Mas também acho lindo se reinventar de um modo "mais urbano" e cheio de coisas "artificiais" porque o novo por fora também mexe com a gente por dentro. Mas, de fato, salão de beleza é uma m... !! Estressante! E com certeza eu preferiria mil vezes pintar minhas unhas de vermelho na praia!! Ou então que um hippie gente boa é quem pintasse os meus cabelos com o vento da brisa do mar batendo no meu rosto! E queria fazer tererê um dia, trancinhas no outro, cabelos vermelhos no outro, curtos no outro, cumpridos no outro, esse tipo de coisa. Eu até tentei fazer muito isso quando era adolescente porque gosto de me chocar com uma aparência estranha. Mas depois estraga tudo... E tb porque, de fato, salão de beleza é uma m...!!!!
Desde que me entendo por gente, acho as mulheres despojadas, sem pintura, sem artifícios, sempre mais interessantes. E as que são
naturalmente bonitas, mais bonitas ficam.
Obrigada, Ana Flora! Achei engraçadíssimo você ter chegado ao blog pela dúvida do culote, hehe! E Júlia, também acho divertido o reinventar, apesar de que concordo com Van Gogh acima, na preferência por uma estética mais natural.
Ownnn!!!
(só um ps: você não precisa de salão!!! ;-))
É de uma leveza sua opção! De vez em quando eu desgosto tanto de salão que avanço de tesoura no meu cabelo. Desde que aposentei descumpro a obrigação de andar em ordem e apresentável. Apenas ando. Cmoo dá vontade. Ouvindo passarinhos, miados e latidos e todos os dias as ondas do mar.
Abração.
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