terça-feira, 8 de janeiro de 2013
Lição
Eu estudava em uma escola chamada Chapeuzinho Vermelho. Lembro-me bem de seus tijolinhos aparentes, das letras de madeira nas paredes e da piscininha. Ficava encostada ao Caseiro, com seus pães e biscoitos de queijo, broas e petas. Era essa nossa cantina. Meu pai nos levava para a escola e íamos lendo tudo pelo caminho: cen-tro-po-pu-lar-de-a-bas-te-ci-men-to-e-la-zer. Parecia-me enorme a escola, fico imaginando como seria revê-la hoje, se ela ainda existisse.
Eu devia ter uns cinco anos de idade, estava encostada em uma de suas paredes de tijolinhos, no pátio. Veio-me esse menininho do maternal, segurou meu braço. Um infinitésimo de segundo e nós nos olhando. Ele não falou palavra, mas me indagou com o olhar. Eu não sabia o que ele perguntava, mas ele segurava meu braço, então assenti com a cabeça. Para onde ele me levaria? Eu não sabia. E assenti. Então ele me mordeu. Isso. De certa forma, eu havia consentido. Doía. E meu pasmo era maior que a dor. Comecei a chorar. Ele, assustado comigo, chorou também. Vieram as professoras acudir. Uma me consolava, outra carregou-o pra longe, consolando-o também.
Foi minha primeira dor de amor.
Às vezes alguém ainda me segura pelo braço e me indaga sem palavras. Eu tenho sempre aquele susto primeiro. Às vezes pergunto: O quê? Paralisada de perplexidade, diante da resposta que não tenho. É que nunca se sabe se esse alguém te levará para bosques floridos ou para becos escuros. Ou se ele te morderá o braço. Então tantas vezes me afasto, recuo, fujo como se corresse pelos pátios da escola, como fiz tantas vezes, ao encontrar novamente o "menino que morde", como passei a chamá-lo.
Outras vezes, obediente e pura, apenas assinto com a cabeça. Eu nunca sei o que ele me pergunta, mas aceno um "sim" e vou.
Às vezes são doces as mordidas.
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4 comentários:
Adoro sua prosa, suas crônicas, a fluência da sua escrita, Lian.
Às vezes penso que levei mordidas demais e que elas me mutilaram...
Beijo grande.
Ivan.
Lindoooo!
Perfeito, Lian! Adoro tudo que você escreve! :D
Hahaha! Isso de mordida tenho cada história! Era a minha defesa fosse qual fosse a briga. Nem tela de arame eu respeitava. Um jeito de me colocar no mundo.
Interesante como algumas lembranças tem afinidade, embora tenhamos crecido em lugares e épocas diferente.
Beijos e nada de dores de amor, que se doer não é amor.
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