quarta-feira, 20 de junho de 2012

Junho


Eu vim em passos hesitantes porque não queria entrar no mês de junho. Queria o "infinitamente maio" de Guimarães Rosa, maio de touros e de voo e de terra e pedra e ilha. E eu entrei em junho doente e desejando voltar. E junho entrou em mim anunciando inverno. Chovia. Eu não queria entrar.

Então me afundei em um tempo longínquo... No tempo do tempo do qual não entendo nada. Eu estava no chamado "segundo jardim" da escolinha, tinha quatro ou cinco anos de idade. Na minha classe havia esse garoto: as fotos delinearam seu rosto em minha memória, mesmo tantos anos depois. Nós dois vestidos de caipiras, na festa junina. Ele rechonchudo, com bigode pintado, eu magrela com pintinhas no rosto. Fazíamos par. Mais do que isso: os adultos insistiam em dizer que éramos namoradinhos. Não éramos. E eu não gostava nada dessa história. O fato é que não me lembro de brincarmos juntos, não me lembro de nossas conversas, se é que havia. Eu era uma criança calada.

Mas de uma coisa me lembro...

Todo recreio, nós nos dávamos as mãos e saíamos a andar, assim, de mãos dadas. Nunca entendi o motivo e nunca soube do início. De quem foi essa ideia? Quando, pela primeira vez, nos demos as mãos e por iniciativa de quem? Sei que andávamos juntos, todo dia, religiosamente e em silêncio. Era nosso ritual cotidiano de caminhar pelo pátio. Diariamente nos dávamos as mãos, com a confiança da criança que não tem motivos. Seu nome era Junho, como o mês.

E, porque é junho de novo, eu penso que devo seguir. "É preciso continuar a travessia" - fui me repetindo enquanto subia a Pedra sozinha e descalça, já que meus chinelos se perderam no caminho. Era a primeira vez que subia sozinha. Era a primeira vez que fazia todo o trajeto descalça. A primeira vez que voltava no escuro, com uma lanterninha em mãos. Confesso que no final do trajeto tive medo, ao ouvir os barulhos da floresta. Desses medos inexplicáveis que não são de gente, nem de bicho e nem de fantasma, mas um medo instintivo e enigmático que vem de se estar à noite sozinha no meio da mata.

Medo da solidão.

Mas é junho. Junho, como o garoto. É preciso seguir. E, mesmo que eu não entenda, será mais fácil se alguém me pegar pela mão.

Continuar a travessia é sempre inauguração.


3 comentários:

Julia Lemos disse...

E de repente você está seguindo. E junho está acabando.

Lian Tai disse...

E de repente está sendo bom! =)

alicexavier@bol.com.br disse...

e ainda terão tantos junhos pela frente... e maio virá antes!!!