Ontem planejamos ir de manhãzinha ao Museu de Imagens do Inconsciente, laaaaaaaaá no Engenho de Dentro. Confesso: não conseguimos acordar. Então, só depois do almoço lá fomos nós, Rio de Janeiro afora procurar o tal museu. Eu com um monte de mapas na mão. Não ajudei muito. Por duas vezes passamos nas ruas do museu e eu, sem saber, não conseguia nem encontrá-las no mapa. Depois de algumas voltas, chegamos.
Desde que me mudei para o Rio, morro de vontade de conhecer o lugar. Na verdade meu interesse pela Nise da Silveira vem desde o início da década de 90, quando li uma entrevista dela na Marie Claire. Pra quem não sabe, a Nise foi uma das psiquiatras que encabeçaram o movimento anti-psiquiatria no Brasil. Inconformada com os métodos tradicionais dos hospitais psiquiátricos, como os choques e a lobotomia, Nise se voltou para um tratamento através de um olhar mais humano, das artes, do contato com animais de estimação. Era através de expressões artísticas que os esquizofrêncios estabeleciam relações entre o mundo externo e aquele outro, interno.
As obras pintadas pelos internos são impressionantes, tanto como manifestações estéticas, como por conter intrigantes questões não só para a psiquiatria, mas para tudo aquilo que tange o ser humano. Seguidora de Jung, Nise aponta relações entre as telas pintadas pelos pacientes, suas histórias pessoais e mitos com que esses artistas nunca tiveram contato, mas retratavam fielmente. Adelina Gomes era uma das internas do hospital, cuja obra é hoje amplamente reconhecida e estudada. Sua mãe era extremamente controladora, e Adelina acabava abrindo mão de seus desejos para satisfazer aos maternos. Certa vez, apaixonou-se por um rapaz, mas a mãe proibiu o namoro. Adelina acabou cedendo, mas foi ficando triste, calada. Um dia, em um surto, estrangulou o próprio gato. Foi internada no mesmo dia. Um tema comum na pintura de Adelina é a mulher transmutada em flor. Inúmeras telas com mulheres-flores foram pintadas por ela. Adelina não conhecia o mito de Dafne, segundo o qual a ninfa, fugindo do amor de Apolo, acaba por ser transformada em um loureiro. São inúmeros os exemplos semelhantes, em que artistas retratam mitos análogos à própria história, sem ao menos terem conhecimento deles. Nise se apóia em Jung para explicar as "coincidências" com os arquétipos coletivos.
Não bastasse a visita ao museu ser uma experiência única, ainda fomos privilegiados, ao nos abrirem portas usualmente fechadas aos outros visitantes. Entramos em salas e salas que continham o acervo guardado do museu. Um acervo imenso, que merece atenção e estudo. Porém é preciso ressaltar que muitas das obras ali não podem ser vistas apenas como material terapêutico, ou "arte de loucos". São materiais reconhecidamente denominados obra de arte. Emydgio de Barros, um dos internos e artistas, por exemplo, foi chamado por Ferreira Gullar de gênio. Ainda por cima encontrei o livro que eu procurava há tempos, "Imagens do Inconsciente", já esgotado. Está certo, o exemplar-raridade que estava lá no museu à minha espera está em francês. Parte da pequena edição que fizeram na exposição da França. Tudo bem, além de ler sobre esse assunto interessantíssimo, ainda pratico meu francês, já bem enferrujadinho, por sinal.
5 comentários:
Ei, que lugar legal hein... Você já ouviu falar sobre Arthur Bispo do Rosário? Ele é um artista que também viveu em clínicas... não me lembro agora direito a história dele, já fiz matéria sobre ele... bjim
Voltei!!!Sei que não vai confessar, mas sentiu minha falta né?
Legal Lian, nem sabía da existência desse museu, embora seja nascido e criado aqui. Nem conhecía as pessoas que você citou, mas gostei muito do filme da Laís, baseado no livro do Austregésilo Carrano Bueno, que também viveu em 'hospitais' assim. 'O canto dos malditos'.O filme, você certamente conhece e já viu, é ótimo, o Santoro tá ótimo, a música é ótima.
Bom,beijão Lian.
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