quarta-feira, 27 de agosto de 2014
Meus pés de chuchu
- Você colhe o que planta. Se plantar abobrinha, certamente não vai colher chuchu. - dizia outro dia meu professor de meditação.
Pois não é que, contrariando essa sabedoria óbvia, eu bem tenho colhido muitos chuchus inesperados? Se tem algo que aprendi neste ano maluco foi isso: aceitar a imprevisibilidade. Plantar, cuidar e regar da melhor maneira que posso. Mas receber de braços abertos o que nascer daí.
Eu tenho meus planos. A terra tem seus planos. A semente tem seus planos.
E a vida se realiza nessa intersecção.
Há algum tempo dei pra cultivar plantinhas na floreira da janela. Começou com um vasinho de hortelã que ganhei de um amigo querido. Depois fui comprando e ganhando outras mais: manjericão, erva doce, lantana, capim-santo. Então, quando estava na Chapada dos Veadeiros, cismei com açafrão-da-terra, que os caboclos queimavam na fogueira e deixava um cheiro delicioso no ar. Resolvi que precisava daquilo na minha casa, e um moço pegou pra mim várias daquelas "batatinhas", que é como eles as chamavam, cheias de raízes. Trouxe-as para casa como um tesouro, comprei um grande vaso e plantei-as lá. Tornou-se um vaso de esperança, que eu regava diariamente, sem saber se aquelas raízes sob a terra estariam realmente a se desenvolver.
Passei alguns meses regando aquele vaso, sem que nada despontasse da terra. Fé é isso: enxergar nos subterrâneos que os olhos não alcançam. E, enquanto esperava meu açafrão nascer, ia enfeitando o vaso com outros objetos: uma pedrinha, dois cataventos e um pregador de roupa pintado, parte do projeto "Pregadores do Amor", da artista Sophia Pinheiro. Gosto de pensar que plantei amor e vento. E que é a partir daí que tudo vai fluir, para que eu colha apenas o que quiser nascer.
Pois há poucas semanas algo quis nascer. São plantas variadas, que não consigo identificar. Honestamente não sei se alguma delas é o tão esperado açafrão. Talvez seja apenas mato.
Mas então terei um pé de mato.
Assim tem sido minha vida: cultivando às cegas e com fé a potência do que vier, sabendo que sou responsável por tudo e não tenho o controle de nada.
Plantando açafrões e colhendo chuchus. Assim, alegremente. Aceitando a convergência dos meus planos com os da Terra e da Semente.
quarta-feira, 13 de agosto de 2014
Ano do Cavalo: Manual de sobrevivência
O importante é nos mantermos vivos.
E, estando vivos, confiar na vida.
Nada mais do que isso: manter-se vivo e se deixar fluir com o Universo.
Ano passado foi o Ano da Serpente: período que nos obrigou a mergulhar pelas profundezas. Essas, tão nossas, mas que nos recusamos a ver. É confortável andar sempre pelo caminho da luz, mas de vez em quando é necessário sair do espaço de conforto. A Serpente nos obrigou a encarar a escuridão. Cavamos túneis escuros e profundos, em um caminho doloroso. E tivemos contato com tudo aquilo que escondêramos no fundo mais fundo.
Então, em 2014, chega o Cavalo a galope. Com seu passo apressado, desenterrando tudo aquilo que havíamos começado a descobrir. O Ano do Cavalo continua revirando todas as camadas com que revestimos as verdades duras. É o ano de caírem as máscaras. Tudo que não for necessário, essencial e verdadeiro ruirá. Eu vejo acontecer, diante de meus olhos.
E tenho minhas perdas. Tantas e tão dolorosas. E tenho meus sustos. E meu fascínio. Porque, desde que comecei a entender minha vida como um pequeno pedaço dessa Vida imensa que é tão mais ampla, de repente faz um pouco de sentido. Eu no meio do furacão, sendo obrigada a me desapegar de pessoas e ideias que eu construíra. De repente me vejo sem minhas bengalas e meus escudos e minhas máscaras.
Nua e ainda de pé.
Aprendi isso: que nada mais posso fazer senão montar o Cavalo. Aceitá-lo. Fluir com ele e me permitir enxergar tudo aquilo que ele me mostra. É menos doloroso, quando não lutamos contra.
Então eu continuo galopando este ano e vendo ruir tudo que em mim não é vida e verdade. E aceitando a energia do Cavalo, que é forte e que faz tudo tremer. E pedindo aos meus amigos que se mantenham vivos e que enfrentem as rupturas de frente e com amor. Porque o que restar há de ser sólido e necessário. É da verdade que nascerá o novo.
Quem viver verá.
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