segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Partida



Parto. Dou-o à luz e que ninguém se engane: a dor é minha. Você que estava recluso em minha escuridão. Que se alimentou do meu sangue, dos meus sonhos. Você que era uterino, que era entranhado. Que eu cultivei dentro de mim, fiz crescer. Você que sugou tudo o que eu era e assim me deu um sentido. Contigo cresci nesta gestação. Hoje te abandono ao mundo. Não sem dor.



Peço-lhe que não me peça que fique. Que não me pergunte se ainda há amor. Sempre haverá. O mundo sem você me assusta, pois era você o horizonte que eu seguia. Hoje não tenho rumo e é esse fio de passado que me sustenta enquanto caminho perdida. Com a liberdade das possibilidades e a pobreza dos sentidos. Mas você, que é névoa e vento e orvalho, você me conduz ao avesso. E sigo em frente.


Ter-te amado tanto faz com que eu tema a morte. Aqui nossos caminhos se separam pela eternidade. Nunca mais é grave e arde como um grito não dado. Mas, ah, os caminhos. São tantos os que preciso descobrir, desbravar. Com você entranhado em meu corpo era-me impossível. Amar pesa. Pressinto que sem você eu tropece em muitas pedras, me fira em muitos espinhos. Pressinto que em muitos momentos desesperar-me-ei ao me encontrar só e perdida. E que conversarei com você, mesmo em sua ausência. E te contarei meus pensamentos, descobertas e todas as coisinhas cotidianas que sei que você gostaria de ouvir.


E sigo mais corajosa porque coberta com todas as delicadezas com que você me vestiu. O lanche que preparava para eu levar para a aula. A mesa de quebra-cabeças. A atenção sincera dada àqueles que amo. As flores escolhidas a dedo, as flores colhidas em árvores. O poema transcrito em caprichada caligrafia. As palavras cruzadas. As tartarugas, os pinguins, os peixes, a cachorrinha bassê, o gato. O quadro. Os textos lidos lado a lado. As discussões filosóficas. A comida que eu gosto preparada com carinho, mesmo errando o ponto ou a mão no sal. A cachoeira gelada. O arroz com hortelã que me fez passar mal e estragar a viagem que lhe dera de presente. O colo em que eu dormia 48 horas seguidas nos longos percursos de ônibus. As músicas em que desafinávamos juntos. O jogo de xadrez que eu sempre perdia. Os chuviscos. O cheiro de sal no corpo. As constelações. As noites de despedida em que o mundo podia acabar. As longas cartas. As saídas noturnas para procurar as comidinhas que eu quase gravidamente desejava. Os apelidos diários que inventávamos. O sorvete de creme com nutella.


Sei que tantas vezes faltei com você. E gostaria de lhe ter dado um amor perfeito, mas era eu, imperfeita, com o melhor que soube dar. E meu melhor foi tão pouco e tudo que eu tinha. Sei que meu amor sempre foi uma oscilação entre o querer e o não querer. Sei que a necessidade da sua presença se completava com uma necessidade profunda de saudade e solidão. E que tantas vezes precisei me afastar. E agora ainda mais. E definitivamente. Definitivamente só e saudosa de ti. E por isso te amo mais.


Talvez algum dia nos cruzemos ao acaso. Que não haja mágoas entre nós. Que as doces lembranças superem as vezes em que te feri. Que seja permitido um abraço forte e sincero. Que nos seja permitido sorrir. Que nos seja permitido chorar. E que cada um siga seu caminho sabendo que somos maiores por termos tido o outro em nossa história. E me lembrarei que um dia fui imortal porque te tinha a meu lado. E seguirei. E seguirás. Que sejamos felizes.



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Esse texto é um meme proposto por Isa Sousa. A idéia é escrever um texto como se rompesse com alguém. Regras do meme: 1) Escrever uma carta como se estivesse rompendo com seu namorado. 2) Escrever estas regras e uma breve explicação do que é o meme. 3) Indicar cinco pessoas.

Li o texto do Renato Cirino em seu blog e fiquei morrendo de vontade de escrever o meu. Então fiquei super contente de ele ter me indicado. Escrevê-lo foi uma espécie de catarse, deixar fluir o dito e o não-dito ao amor simbólico, esse que é feito dos amores do passado, da experiência presente e da projeção de futuro. Espero que as pessoas que eu indicar também gostem da idéia e se divirtam. São elas: Erika, Alice, Mayara, Doug e Gustavo.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Caio em mim

O Pablo era paixão antiga, mas um dia o relembrei de repente e me veio essa vontade súbita de revisitá-lo. De Pablo passei para Affonso. E agora Caio, minha nova paixão. Fecho-me no quarto para ficar, em silêncio, a sós com ele. Caio me entende como ninguém. Ou melhor, Caio me entende como alguém. Como Clarice. Caio me traduz. Ele encontra essa ferocidade em mim, essa ânsia, essa solidão profunda, indevassável. E me reconta com uma aspereza quase suave, que não me assusta. Nos encontramos em emoção ritualística. Tenho vontade de chorar. Acontece quando encontro um dos meus. Grito no silêncio absoluto da reclusão com Caio. Caio em mim. No infinito do meu ínfimo. Caio.... Caio...caio...

domingo, 23 de agosto de 2009

Seguir viagem

Essa semana veio acompanhada de uma vontade de sair correndo... começar a correr, percorrer cidades, países, correr, correr, até achar um lugar, o meu lugar. De repente o mundo em que estou me parece tão estranho e alheio a mim. Aí de repente encontro uma música, uma poesia, um conto, capaz de me comover. De me transportar para esse lugar onde eu gostaria de estar: eu.

sábado, 15 de agosto de 2009

Os dias de hoje


São dias em que o que me abriga também me ameaça.

São dias em que meu melhor é o que me acusa.

São dias em que tudo é antigo e de uma novidade assustadora.

São dias em que as ações mais inconsequentes trazem os maiores prêmios.

São dias em que espirrar, ter um resfriado ou crise alérgica são de um mau tom quase imperdoável.

São dias que são repetições dos dias.

São dias de planos coletivos, com sonhos de amanhã.

São dias que misturam as quatro estações do ano em um só dia.

São esses, os dias de hoje.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Elefantinho colorido


Quando a Marina esteve aqui, ela me comprou uma miniatura de estante. Pintamo-la e fizemos coisinhas para enfeitá-la. Mandei imprimir fotos pequeninas, fiz albinhos de fotografias, revistinhas, comprei porta-retratos de fotos 3X4.


Fiquei empolgada com coisas pequeninas e continuo fazendo-as.


Também tenho lido muita poesia.


Férias para mim é isso. Próxima semana, de volta à ativa.

sábado, 1 de agosto de 2009

Encontros

Estranhos encontros têm marcado meus últimos dias. Encontros ao acaso, encontros de gente desencontrada, encontros combinados, encontros desejados. A cada um deles é um pedaço de mim que também encontro. Aquele pedaço que sente o coração se apertar ou bater mais forte e me conta onde eu devo estar.